Trade dress: Necessária a prova, deve o juiz deferi-la de ofício, quando não requisitada

É sabido no âmbito da Propriedade Intelectual que as ações manejadas sob argumento de violação de trade dress não podem prescindir da realização de perícia técnica para constatar a violação ou a não violação. 

Essa obrigatoriedade decorre da natureza do bem jurídico tutelado, haja vista que o trade dress, ou “conjunto-imagem” – como se passou a chamar a partir da pena de Tinoso Soares – não está previsto no arcabouço legal protetivo no campo da propriedade industrial, geralmente observável na Lei da Propriedade Industrial, a Lei Federal nº. 9.279/96, que regula, por exemplo, a proteção às marcas, às patentes de invenção, aos modelos de utilidade, aos desenhos industriais, às indicações geográficas, etc. Não existindo previsão na legislação, a proteção advém da jurisprudência pátria, sendo imprescindível a realização de perícia técnica onde se avalie a existência ou não de violação, sendo esse o posicionamento do STJ, vejamos:

RECURSO ESPECIAL. USO INDEVIDO DE MARCA. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. CONJUNTO-IMAGEM (TRADE DRESS). COMPARAÇÃO NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA TÉCNICA. ACÓRDÃO RECORRIDO FUNDAMENTADO EM SIMPLES OBSERVAÇÃO DAS EMBALAGENS DOS PRODUTOS EM CONFRONTO. DIREITO À PRODUÇÃO DE PROVA.

    1. A fim de se concluir pela existência de concorrência desleal decorrente da utilização indevida do conjunto-imagem de produto da concorrente é necessária a produção de prova técnica (CPC/73, art. 145). O indeferimento de perícia oportunamente requerida para tal fim caracteriza cerceamento de defesa
    2. Recurso especial providoArt. 492. É vedado ao juiz proferir decisão de natureza diversa da pedida, bem como condenar a parte em quantidade superior ou em objeto diverso do que lhe foi demandado.

(STJ, REsp 1.778.910 – SP, Min. Rela. Maria Isabel Galotti, Quarta Turma, julgado: 06/12/2018) 

Diante desse fato, observa-se um questionamento trazido pela experiência forense: a ausência de pedido da prova quando da resposta ao despacho de especificação de provas, resulta em preclusão?

 

 

A resposta é não. Isso porque, embora a regra geral seja a operação da preclusão (cf. REsp 1689923 RS), sendo a prova pericial imprescindível ao julgamento da demanda, deverá o juiz, de ofício, determinar a sua produção, afastando-se a focalização na formalidade processual (da preclusão temporal) para a busca da verdade real, o que é possível graças aos poderes instrutórios do juiz.

É nesse sentido a dicção do art. 370 do CPC, que determina: 

Art. 370. Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito.

Portanto, não pode o magistrado julgar improcedente a ação de abstenção de uso de trade dress sob o argumento da aplicação do instituto da preclusão temporal, justamente porque sendo a prova em questão imprescindível ao deslinde da lide, a sua não realização resulta, em última análise, em Non Liquet, portanto, em abstenção de juízo, que é vedado ao magistrado.

Nesse sentido, assim tem decidido o e. Tribunal de Justiça de São Paulo, em suas Câmaras Reservadas de Direito Empresarial, vejamos:

APELAÇÃO CÍVEL – Ação de obrigação de não fazer cumulada com pedido de indenização por danos materiais e morais – Violação de Marca e Trade Dress – Sentença que julgou improcedente o pedido, por entender, nos termos do artigo 373 do CPC 2015, que as autoras, por não terem requerido a realização de prova pericial, não haviam se desincumbido de seu ônus – Insurgência das autoras – PRELIMINAR – (…) MÉRITO – Juízo a quo que, ao julgar a questão concernente à marca e ao trade dress, entendeu que não houve a requisição de perícia, sendo essa prova essencial para que se comprovasse a violação – Sentença que padece de nulidade – (…) deveria o juízo, ao ter reputado a prova fundamental para o julgamento do pedido, tê-la determinado de ofício – Poderes instrutórios do juiz, nos termos do artigo 370 do CPC de 2015 – Busca da verdade real do processo – Produção de provas de ofício que, inclusive, não se sujeita à preclusão (…). 

(TJ-SP – AC: 10947749820208260100 SP 1094774-98.2020.8.26.0100, Relator: Jane Franco Martins, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de Publicação: 18/08/2022)

Diante do exposto, cristalino que a ausência de requisição de produção de prova pericial pela parte interessada, após sua intimação para especificação de provas, não resulta em preclusão temporal quando se tratar de caso envolvendo violação de trade dress, devendo a produção da prova ser determinada de ofício pelo magistrado, com rateio de seu custo entre as partes do processo.

Autores do comentário: Mario Filipe Cavalcanti e Cesar Peduti Filho, Peduti Advogados.

 

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Trânsito em Julgado e a Possibilidade de Impugnação

Em âmbito processual, para garantia da ordem e da segurança jurídica, identificamos como pedra fundamental o instituto do trânsito em julgado das decisões judiciais, onde uma vez decida a questão e sem a oportunidade de apresentação de recursos, aquela determinação ecoará seus efeitos aos envolvidos sem a possibilidade de revisão.

 

Entretanto, existem diferentes mecanismos processuais para corrigir eventuais injustiças ou nulidades em decisões judiciais, sendo eles a Ação Rescisória e a Querela Nullitatis, cujo objetivo é a impugnação de uma decisão judicial eivada de vícios, sejam eles de validade ou da existência.

 

Quando tratamos da Ação Rescisória, estamos diante de um instrumento utilizado para desconstituir uma sentença transitada em julgado, ou seja, uma decisão judicial que não pode mais ser modificada por meio de recursos ordinários, ocorrendo em casos específicos, conforme hipóteses contidas no artigo 966 do Código de Processo Civil, tendo como marco temporal 2 anos do trânsito em julgado da decisão rescindenda.

 

 

Por outro lado, a Querela Nullitatis, também conhecida como ação de nulidade, busca anular uma decisão judicial que possui algum vício de nulidade insanável desde sua origem. Ao contrário da Ação Rescisória, a Querela Nullitatis pode ser ajuizada a qualquer tempo, mesmo após o trânsito em julgado da decisão.

 

Importante observarmos que ao obtermos êxito na Ação Rescisória, a sentença rescindida é anulada, restabelecendo-se a situação anterior ao seu proferimento. Nesse caso, a decisão anterior volta a ter validade e poderá ser reavaliada pelo juízo competente.

 

Já na Querela Nullitatis, o objetivo é anular a decisão judicial viciada desde a sua origem. Ao ser acolhida a Querela Nullitatis, a decisão é declarada nula, ou seja, é como se ela nunca tivesse existido. Isso significa que os efeitos da decisão nula são desconsiderados, restabelecendo-se a situação anterior ao seu proferimento.

 

A Ação Rescisória pode ser proposta apenas pelas partes que foram diretamente afetadas pela decisão rescindenda, ou seja, aquelas que figuraram como parte no processo original, ao passo que na Querela Nullitatis, qualquer pessoa que possua interesse jurídico pode propor a ação, independentemente de ter sido parte no processo original. Isso significa que terceiros ou até mesmo pessoas que não estavam envolvidas diretamente no processo podem ajuizar a Querela Nullitatis para buscar a nulidade da decisão judicial viciada.

 

Com tais observações, conclui-se que a Ação Rescisória e a Querela Nullitatis são mecanismos processuais com finalidades semelhantes, ou seja, a impugnação de decisões judiciais. No entanto, suas diferenças são fundamentais, sendo que a Ação Rescisória tem prazo decadencial, exige fundamento legal específico e pode ser proposta apenas pelas partes afetadas, a Querela Nullitatis não possui prazo decadencial, não possui rol taxativo de causas de cabimento e pode ser proposta por qualquer pessoa com interesse jurídico.

 

É importante destacar que tanto a Ação Rescisória quanto a Querela Nullitatis são institutos jurídicos complexos e sujeitos a diversas particularidades, recomendando-se sempre consultar um advogado especializado para orientação específica em cada caso, levando em consideração a legislação aplicável e a jurisprudência atualizada.

 

Advogados autores do comentário: Pedro Zardo Junior e Cesar Peduti Filho, Peduti Advogados

Se quiser saber mais sobre este tema, contate os autores Dr. Pedro Zardo Junior ou o Dr. Cesar Peduti Filho.

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