A posição processual do INPI nas ações de nulidade

É comum nas ações anulatórias de registros concedidos pelo INPI, que a autarquia se manifeste em suas contestações arguindo possuir posição dinâmica (interpolar) no processo, posição esta que adviria de sua natureza de litisconsorte sui generis, garantida por precedentes do STJ. 

 

Também é comum que o INPI requeira, muitas vezes, a improcedência das demandas, mas tente se isentar de eventual sucumbência, para tal, intitulando suas peças de ‘Manifestação’, não de ‘contestação’ e, às vezes, argumentando que como a decisão caberia ao magistrado, nas mãos dele estaria a definição.

 

Ora, é óbvio que a definição da lide cabe ao magistrado, mas também é evidente que sem as partes, seus procuradores e seus interesses manifestos, não há atividade jurisdicional possível, não cabendo aos magistrados a inovação ou a iniciativa na instauração de processos, muito menos a definição dos interesses das partes em disputa.

 

Portanto, é a manifestação de cada parte direcionada a um sentido e, portanto, a um interesse no dinamismo processual, que define o seu papel no processo e, portanto, o polo da lide que deve ocupar, não sendo permitido o comportamento contraditório.

 

É cediço, pois, que tendo a autarquia proferido os atos administrativos federais cuja anulação é pleiteada nas ações anulatórias previstas na LPI, sua posição processual lógica é de Ré quando a ação for ajuizada por particular para anular seus atos e de autora quando ela própria ajuizar ação para anular seus atos, vindo a ser corré nos casos de litisconsórcio necessário com eventuais pessoas físicas ou jurídicas citadas em suas decisões como interessadas no reconhecimento de eventuais colidências.

 

Não obstante, o INPI pode cambiar sua posição processual, ao passo em que o interesse público por ele defendido, na concessão de exclusivo sobre propriedade industrial, exigir essa migração. Portanto, mesmo nas demandas contra ele ajuizadas por particular, poderá o INPI figurar como litisconsorte do autor, etc.

 

 

Tais definições foram alcançadas mediante entendimento jurisprudencial do STJ, sendo julgado relevante o da pena do Ministro Luís Felipe Salomão, seguido pela Quarta Turma, no REsp nº. 1.817.109 – RJ, que estabeleceu o seguinte: 

 

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE NULIDADE DE REGISTRO DE MARCA. PROPRIEDADE INDUSTRIAL. TRANSAÇÃO ENTRE AS SOCIEDADES EMPRESÁRIAS LITIGANTES. DISCORDÂNCIA DO INPI, QUE INTEGRAVA O POLO PASSIVO DA LIDE. EXTINÇÃO DO FEITO. IMPOSSIBILIDADE. 1. Consoante cediço nesta Corte, a atuação processual do INPI, na ação de nulidade de registro de marca, quando não figurar como autor ou corréu, terá a natureza de intervenção sui generis (ou atípica), por se dar de forma obrigatória, tendo em vista o interesse público preponderante de defesa da livre iniciativa, da livre concorrência e do consumidor, direitos constitucionais, essencialmente transindividuais, o que não apenas reclama o temperamento das regras processuais próprias das demandas individuais, como também autoriza a utilização de soluções profícuas previstas no microssistema de tutela coletiva.

Precedentes. 2. Nessa perspectiva, admite-se a chamada “migração interpolar” do INPI (litisconsórcio dinâmico), a exemplo do que ocorre na ação popular e na ação de improbidade, nas quais a pessoa jurídica de direito público ou de direito privado, cujo ato seja objeto de impugnação, pode abster-se de contestar o pedido ou atuar ao lado do autor, desde que isso se afigure útil ao interesse público, nos termos dos artigos 6º, § 3º, da Lei 4.717/65 e 17, § 3º, da Lei 8.429/92. 3. Na espécie, a autarquia, após citada para integrar a relação processual, apresentou contestação, suscitando a sua ilegitimidade passiva ad causam, requerendo intervenção no feito na qualidade de assistente especial e aderindo à tese defendida pela autora. Posteriormente, insurgiu-se contra a transação extrajudicial celebrada entre as sociedades empresárias (autora e segunda ré), opondo-se à extinção da ação de nulidade de registro, ao argumento da existência de dano ao interesse público. 4.

Nesse quadro, configurou-se o deslocamento do INPI da posição inicial de corréu para o polo ativo da demanda — o que pode ser traduzido como um litisconsórcio ativo ulterior —, ressoando inequívoco que a transação extrajudicial, celebrada entre a autora originária e a segunda ré, não tem o condão de ensejar a extinção do processo em que remanesce parte legitimamente interessada no reconhecimento da nulidade do registro da marca. 5. Nada obstante, cumpre ressalvar o direito da autora originária — que, por óbvio, não pode ser obrigada a permanecer em juízo — de pleitear desistência na instância de primeiro grau, em consonância com o acordo que não produz efeitos em relação ao INPI. 6. Recurso especial não provido. (g. n.).

(STJ, RESP Nº 1.817.109 – RJ, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe: 25/03/2021)

 

Esclarecido, portanto, que a jurisprudência do STJ reconhece ao INPI o mesmo dinamismo polar observado na ação popular, cumpre estabelecer agora as consequências lógicas da assunção de posicionamento pela autarquia.

 

Isso porque, o INPI deverá definir se apresentará ‘Manifestação’ nos autos, aderindo ao polo do autor da demanda e, portanto, pugnando pela anulação de seu ato administrativo ou se apresentará ‘Contestação’ à demanda e, portanto, se manterá no polo passivo tal como eleito quando do ajuizamento da demanda pelo particular.

 

É que, se manifestando pela procedência não deverá arcar com o ônus da sucumbência na demanda procedente e, de outro lado, se manifestando pela improcedência, deverá arcar com esse ônus na demanda procedente, sobretudo por ter dado causa ao ajuizamento.

 

Em suma, a consequência direta da migração polar para o polo ativo, por exemplo, é a anistia judicial, no que tange à sucumbência, por ter dado causa ao ajuizamento.

 

 

Autores do comentário: Mario Filipe Cavalcanti and Cesar Peduti Filho, Peduti Advogados.

 

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