Em recente decisão, a Justiça Federal do Rio de Janeiro negou provimento a ação movida pela multinacional japonesa Citizen que buscava anular os registros da marca “Bulova Collection” concedidos pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) à empresa brasileira Bulova Collection Design de Interiores. O juiz Eduardo André Brandão de Brito Fernandes fundamentou sua decisão na aplicabilidade do Princípio da Especialidade, o qual permite a coexistência de marcas idênticas ou similares quando dispostas em segmentos de mercado distintos, sem risco de confusão ao público consumidor.
No embate judicial, a Citizen sustentou que a marca “Bulova Collection” reproduzia indevidamente o nome de sua marca notoriamente conhecida e anteriormente registrada “Bulova”, infringindo a Lei da Propriedade Industrial (LPI – Lei 9.279/1996) e reforçou seu direito prioritário sobre o uso do nome.
Por outro lado, a defesa da Bulova Collection Design de Interiores argumentou que as duas empresas atuam em setores completamente distintos: enquanto a Citizen atua massivamente no mercado de relógios e joias, a Bulova Collection se apresenta no segmento de móveis e artigos de decoração. Assim, a Bulova Collection não ofereceria qualquer risco de associação ou confusão perante o público consumidor. Desta forma, a aplicabilidade do Princípio da Especialidade se fez essencial, para que fosse permitida a coexistência de marcas idênticas em mercados diversos.
O Princípio da Especialidade, previsto no artigo 124 da LPI, estabelece que o direito de exclusividade no uso de uma marca é limitado aos produtos e/ou serviços para os quais ela foi registrada. Desta forma, marcas idênticas ou semelhantes podem coexistir no mercado desde que atuem em segmentos totalmente diferentes, sem oferecer risco de confusão ao consumidor.
Este preceito visa manter o equilíbrio entre os direitos dos titulares de marcas e a liberdade concorrencial, prevenindo que registros de marcas sejam utilizados de forma abusiva e impedindo a entrada de novos concorrentes no mercado. Noutras palavras, pode-se depreender que este Princípio nada mais é do que um ponto referenciador que orienta a ponderação entre o direito de exclusividade dos titulares de marcas e o interesse público ante a livre concorrência, funcionando como um verdadeiro vetor de equilíbrio na balança de interesses que permeiam o sistema marcário brasileiro.
Assim, a decisão reflete a aplicabilidade do Princípio da Especialidade, reforçando a autonomia de marcas que atuam em segmentos de mercado distintos. Além disso, tal precedente evidencia a importância do exame criterioso do risco de confusão ou associação entre marcas, considerando não apenas a semelhança entre os sinais distintivos, mas também seus canais de distribuição, o público-alvo, o grau de atenção do consumidor e, especialmente, a natureza dos produtos ou serviços oferecidos.
Essa abordagem contribui para um maior segurança jurídica no mercado, permitindo que empresas atuem com seus sinais distintivos, sem o risco de eventuais ações infundadas de concorrentes que busquem barrar o uso de marcas devidamente registradas, especialmente em nichos mercadológicos sem qualquer conexão entre si.
Nesta senda, a decisão da Justiça Federal do Rio de Janeiro é um importante marco jurídico na aplicação do Princípio da Especialidade no direito marcário brasileiro. Ela reforça a necessidade de um exame detalhado das circunstâncias do caso concreto, evitando decisões que possam prejudicar a liberdade concorrencial e a inovação no mercado.
Além disso, o decisum revela-se especialmente relevante diante das novas diretrizes de exame de mérito adotadas pelo INPI, que buscam conferir maior celeridade ao processo de registro e promover a uniformização do entendimento da jurisprudência administrativa.
Ao reconhecer que sinais semelhantes podem coexistir pacificamente quando destinados a classes e segmentos distintos de produtos e/ou serviços, o INPI reafirma a racionalidade do sistema marcário, evitando análises excessivamente restritivas que poderiam resultar em indeferimentos arbitrários ou protelatórios. Nesse contexto, a decisão judicial que prestigia a autonomia dos mercados envolvidos alinha-se com esse esforço institucional de eficiência e coerência, fortalecendo a previsibilidade nas decisões administrativas e contribuindo para a segurança jurídica dos titulares de marca.
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Advogado(a) autor(a) do comentário: Lethycia Ventura Brilhante Nogueira e Cesar Peduti Filho, Peduti Advogados
Fonte: Justiça Federal nega pedido da Citizen e mantém marca de empresa brasileira + https://www.conjur.com.br/2025-mai-21/justica-federal-nega-pedido-da-citizen-e-mantem-marca-de-empresa-brasileira/
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Se quiser saber mais sobre este tema, contate o autor ou o Dr. Cesar Peduti Filho.