Há poucos dias alguns veículos de informação passaram a circular a notícia de que o Clube de Regatas do Flamengo acionou a rede Globo por uso não autorizado da marca “FLAMENGO” (de alto renome) no jogo Cartola FC, que é um fantasy game por meio do qual os jogadores escolhem e gerenciam seu próprio clube com base no rendimento dos jogadores profissionais em campo na realidade.
O incômodo do clube já iniciou em meados de 2020, quando questionou a Globo via notificação extrajudicial sobre o uso ostensivo da marca e sinais distintivos “Flamengo” na plataforma sem qualquer contrapartida.
A rede Globo alegou, na época, que o Cartola FC seria uma ação promocional do Campeonato Brasileiro, de forma que o uso de marca no Cartola estaria englobado e previsto no contrato de transmissão e exibição firmado com o clube referente ao campeonato em questão (válido entre 2019 e 2024).
A justificativa não foi aceita pelo rubro-negro, que ajuizou ação judicial perante as Varas Empresariais da Comarca do Rio de Janeiro, afirmando que, longe de ser uma ação promocional, o fantasy game seria, na verdade, um negócio muito lucrativo para a emissora, gerando faturamento de milhões. Segundo o clube nos autos, o faturamento da emissora seria milionário, seja pelos patrocínios (espaços publicitários), seja com a assinatura dos jogadores (a versão “Pro” custa R$ 54,90).
Assim, segundo a narrativa da ação judicial, ainda que exista contrato entre o Flamengo e a emissora tendo por objeto o Campeonato Brasileiro, o uso ostensivo da marca Flamengo no jogo Cartola configuraria desvirtuamento do contrato entre as partes, que não engloba a hipótese do Cartola FC.
Assim, o Flamengo requer a abstenção de uso da marca no Cartola FC; a indenização pelo uso não autorizado ao longo dos anos ou, subsidiariamente, a revisão do contrato com a Globo para revisão dos valores ajustados à título de pagamento ao clube diante do uso da marca.
A nosso ver, a discussão, então, necessariamente passa pelo questionamento sobre o alcance do contrato entre as partes, uma vez que se poderia alegar, ou mesmo supor, que o objeto da avença estaria limitada a transmissão e exibição dos jogos durante o Campeonato Brasileiro, o que incluiria o uso da marca limitado às partidas realizadas.
Uma vez que se entenda pela premissa de interpretação estrita e restrita do objeto, há que se ponderar que, sendo o Cartola FC um jogo de alta popularidade e alcance (quase 2 milhões de pessoas inscritas) e que aufere lucro direto e indireto, e sendo o Flamengo uma marca bastante valiosa (único clube fora da Europa entre as 50 marcas mais valiosas do futebol – 96 milhões de euros), sendo, inclusive, de alto renome (artigo 125, da Lei de Propriedade Industrial), nos pareceria certo, à essa primeira vista, que há uso de marca que extrapola os limites do contrato e, portanto, se trataria de uso não autorizado de marca. Podemos cogitar, ainda (e, dependendo, claro, de nuances que certamente serão expostas nos autos durante a instrução), que se pode cogitar de um aproveitamento parasitário praticado contra o clube.
O aproveitamento parasitário ocorre quando não há concorrência entre os sujeitos (e não há, nitidamente), mas um dos sujeitos se utiliza de um sinal distintivo deveras famoso a ponto de dele se beneficiar diretamente em detrimento do titular. Afinal de contas, marcas famosas tem um poder de atratividade altíssimo perante o público, ainda que a atração resulte de ato inconsciente pelo afetado, no caso, o público em geral. Haveria, em todos os casos, o correspondente dever de indenizar.
Agora, nos resta acompanhar os rumos dessa disputa entre o Clube de Regatas do Flamengo e a rede Globo, disputa essa que reinicia um cenário já instável e de atritos entre o clube e a emissora nos últimos anos.
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Advogada autora do comentário: Rafaella Franco
Fonte: Flamengo abre nova guerra contra a globo na justiça
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