Prescreve em cinco anos a ação de perdas e danos pelo uso de marca comercial (Súmula 143/STJ)

Prescreve em cinco anos a ação de perdas e danos pelo uso de marca comercial

Prazo prescricional das ações de indenização/reparação pelo uso indevido de marca comercial – Súmula 143 do Superior Tribunal de Justiça

Cuidaremos da análise jurídica acerca do prazo prescricional das ações de indenização/reparação pelo uso indevido de marca comercial e de considerações doutrinárias e legislativas.

Inicialmente, mister diferenciar o instituto da prescrição e da decadênciaSegundo a Professora Dra. Maria Helena Diniz:

A decadência extingue o direito e indiretamente a ação; a prescrição extingue a ação e por via obliqua o direito; o prazo decadencial é estabelecido por lei ou vontade unilateral ou bilateral; o prazo prescricional somente por lei; a prescrição supõe uma ação cuja origem seria diversa da do direito; a decadência requer uma ação cuja origem é idêntica à do direito; a decadência corre contra todos; a prescrição não corre contra aqueles que estiverem sob a égide das causas de interrupção ou suspensão previstas em lei; a decadência decorrente de prazo legal pode ser julgada, de oficio, pelo juiz, independentemente de arguição do interessado; a prescrição das ações patrimoniais não pode ser, ex oficio, decretada pelo magistrado; a decadência resultante de prazo legal não pode ser enunciada; a prescrição, após sua consumação, pode sê-lo pelo prescribente; só as ações condenatórias sofrem os efeitos da prescrição; a decadência só atinge direitos sem prestação que tendem à modificação do estado jurídico existente.” 

O Código Civil de 1916 estabelecia, em seu artigo 178, §10, IX, o prazo prescricional de cinco anos para ação por ofensa ou dano causados ao direito de propriedade; contado o prazo da data em que se deu a mesma ofensa ou dano.

O legislador brasileiro, visando a solucionar questões controversas acerca da prescrição e decadência e, assim, estabelecer normas mais seguras em relação às preexistentes no Código Civil de 1916, destinou o Título IV do Livro III da Parte Geral do novo Código Civil de 2002 para tratar do tema.

Nesse contexto, com relação à prescrição, objeto do presente trabalho, determinou em seu artigo 189 que: “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”. 

O artigo 205 estabelece o prazo prescricional geral de dez anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor. Por sua vez, o artigo 206 estabelece os prazos prescricionais especiais, dentre os quais destacamos o prazo de três anos para pretensão de reparação civil, previsto no §3º, item V do precitado dispositivo.

Note-se que o novo Código Civil de 2002, ao contrário do Código Civil de 1916, silenciou-se quanto ao prazo prescricional para ação de reparação por ofensa ou dano causados ao direito de propriedade.

Nada obstante o silêncio do legislador, em 14 de maio de 1996, data anterior ao Código Civil vigente, foi promulgada a Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial), a qual dispõe em seu artigo 225 que: 

Prescreve em cinco anos a ação para reparação de dano causado ao direito de propriedade industrial”.

Seria então a Lei de Propriedade Industrial a legislação prevista no artigo 205 do Código Civil, a qual estabelece prazo prescricional menor de dez anos? Em outra visão, poderia o artigo 225 da Lei de Propriedade Industrial ter sido revogado pelo §3º, item V, do artigo 206 do Código Civil de 2002, o qual estabelece o prazo de três anos para pretensão de reparação civil? 

Pois bem. A orientação jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (“STJ”) caminha no sentido que, em se tratando de prescrição da ação para reparação de dano causado ao direito de propriedade industrial, legislações de caráter geral devem ceder diante do caráter especial do disposto no artigo 225 da Lei de Propriedade Industrial, segundo a regra da especialidade da norma jurídica.

Nesse sentido, visando a restabelecer a segurança jurídica quanto à específica questão de marcas abordada neste, o STJ emitiu a Súmula 143, a qual dispõe que: “prescreve em cinco anos a ação de perdas e danos pelo uso de marca comercial”.

Portanto, indubitável a permanência do prazo prescricional quinquenal para o interessado reclamar em juízo a reparação por ofensa ou dano ao seu direito de propriedade industrial, incluindo-se aqui questões inerentes ao direito marcário.

 

Prescreve em cinco anos a ação de perdas e danos pelo uso de marca comercial

 

Em nossa opinião, correto o entendimento firmado pelo STJ, eis que lei especial (lex specialis) prevalece sobre a geral, caso não haja revogação expressa de uma ou outra (inteligência do artigo 2º, §2º, da Lei nº 4.657/42 – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro).

Outra questão posta em debate refere-se ao termo a quo do prazo prescricional para pleitear reparação de dano causado ao direito de propriedade industrial.

Como vimos, o artigo 189 do Código Civil vigente dispõe que “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”.

Assim, a prescrição nada mais é que a perda da pretensão inerente ao direito subjetivo, este consubstanciado na situação jurídica, por meio do qual o titular tem direito, nos limites da legalidade, a um determinado ato em face do destinatário, em razão da passagem do tempo. 

Nesse sentido, o Professor Dr. Pontes de Miranda afirma que “a prescrição não atinge, de regra, somente a ação; atinge a pretensão, cobrindo a eficácia da pretensão e, pois, do direito, quer quanto à ação, quer quanto ao exercício do direito mediante cobrança direta (…) ou outra manifestação pretensional”. 

Por se tratar de um direito subjetivo, referido prazo, em essência, começa a correr tão logo seja violado o direito de propriedade industrial. Voltando-se para o tema em debate, o dano perpetua-se enquanto o uso indevido da marca alheia registrada não cessar.

Esse entendimento é corroborado pela lição do Professor Dr. Antônio Luís da Câmara Leal, o qual leciona que “duas condições exige a ação, para se considerar nascida (nata), segundo a expressão romana: a) um direito atual atribuído ao seu titular; b) uma violação desse direito à qual ela tem por fim remover. […] Não basta, porém, que o direito tenha existência atual e possa ser exercido por seu titular, é necessário, para admissibilidade da ação, que esse direito sofra alguma violação que deva ser por ela removida. É da violação, portanto, que nasce a ação. E a prescrição começa a correr desde que a ação teve nascimento, isto é, desde a data em que a violação se verificou.

E, em caso de violação permanente, a jurisprudência pátria caminha no sentido que a pretensão indenizatória se renova e, com ela, o termo a quo da prescrição. Vejamos:

“Quanto ao pedido de indenização pelo uso indevido da marca, já se manifestou esta Corte, em pelo menos uma oportunidade, no sentido de que, sendo a violação, em tais casos, de caráter permanente, o termo inicial do prazo prescricional nasce a cada dia em que o direito é violado.”

“Com efeito, conforme precedente da lavra do eminente Min. Luis Felipe Salomão, apesar de a lei de propriedade industrial prever o prazo prescricional de 5 (cinco) anos para a propositura da ação de indenização por uso indevido de marcas, o termo inicial do lapso prescricional, em se tratando de violação continuada, renasce a cada dia, razão pela qual não há se falar em reconhecimento da prescrição da pretensão da requerente.”

“Nesse passo, o prazo de prescrição, em essência, começa a correr tão logo nasça a pretensão, a qual tem origem com a violação do direito subjetivo. Quanto ao caso em análise, é inequívoco que a pretensão ao recebimento da indenização nasce tão logo seja violado o direito de propriedade industrial, porém tal dano se perpetua enquanto o uso indevido de marca alheia registrada não cessar.

[…] Assim, considerando que a violação é permanente, enquanto a recorrente continuar a utilizar marca alheia registrada, diariamente o direito será violado, nascendo nova pretensão indenizatória; motivo pelo qual não há como reconhecer que a pretensão da parte recorrida estava prescrita quando do ajuizamento da demanda em questão.

Esse entendimento é acompanhado pelo Professor Dr. Caio Mário da Silva Pereira: “se a violação do direito é continuada, de tal forma que os atos se sucedam encadeadamente, a prescrição ocorre do último deles, mas se cada ato dá direito a uma ação independente, a prescrição alcança cada um, destacadamente.”

Em conclusão, o Judiciário acertadamente caminha de mãos dadas com a Doutrina pátria, no sentido que, em se tratando de prescrição da ação para reparação de dano causado ao direito de propriedade industrial, legislações de caráter geral devem ceder diante do caráter especial do disposto no artigo 225 da Lei de Propriedade Industrial, o qual prevê um prazo quinquenal, sendo o termo inicial a data da violação, renovando-se em caso de uso continuado.

Advogada autora do comentário: Thaís de Kássia R. Almeida Penteado

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A prescrição dos direitos morais do autor e o caso envolvendo o álbum “Mãos Dadas”, do sambista Noca da Portela

Introdução – Os danos patrimoniais e morais decorrentes da violação da obra intelectual

O art. 22 da Lei nº 9.610/98 (Lei de Direitos Autorais – LDA) assegura ao autor de uma obra intelectual a reparação pelos danos decorrentes do uso indevido ou desautorizado de sua criação, que assumem duas naturezas distintas: os danos patrimoniais e morais. 

Os danos patrimoniais do autor, previstos no art. 28 e seguintes da LDA, são originados, principalmente, dos benefícios econômicos ilicitamente angariados pelo infrator com a comercialização da obra de forma desautorizada. 

Em outras palavras, a pessoa que se utiliza de obra intelectual alheia sem autorização do criador e com fins comerciais deverá ressarci-lo pecuniariamente, transmitindo-lhe os benefícios econômicos que obteve com a exploração da obra e/ou pagando-lhe aquilo que o autor deixou de lucrar pelo ilícito. 

Por sua vez, os direitos morais do autor encontram-se previstos no art. 24 da Lei de Direitos Autorais e compreendem, dentre outros, os direitos à paternidade, ao ineditismo e à integridade da obra autoral. 

Diferentemente dos direitos patrimoniais, os direitos morais são intransferíveis e inalienáveis, permanecendo com o autor independentemente da cessão ou o licenciamento dos direitos de exploração econômica da obra a terceiros. 

Assim, aquele que se utiliza de obra alheia de forma indevida ou sem a autorização atinge o próprio autor, já que a obra é considerada uma extensão de seu espírito. Por desvirtuar a obra ou seu propósito, o infrator deve ressarcir pecuniariamente o criador e tal compensação não se confunde com os danos de natureza patrimonial.

Apesar de a Lei de Direitos Autorais prever o dever de reparação dos danos patrimoniais e morais causados pelo uso indevido da obra intelectual, é importante se observar a existência do instituto da prescrição no direito brasileiro.

De forma objetiva, a prescrição é conceituada pelo Código Civil (art. 189) como a perda da pretensão de se requerer em juízo a reparação pela violação de direitos. Os prazos prescricionais variam de acordo com a natureza do direito violado, sendo dispostos no Código Civil, em seus artigos 205 e 206.

No tocante aos danos causados a direitos autorais, a doutrina e a jurisprudência pátrias entendem pela incidência do prazo prescricional de 03 anos para se obter a compensação pelos danos, por se tratar de uma reparação de natureza civil. 

Fonte: Carta Capital

Contudo, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, no julgamento do caso envolvendo a reprodução indevida da fotografia utilizada no álbum “Mãos Dadas”, do sambista Noca da Portela, inovou ao entender pela não incidência da prescrição sobre os direitos do autor receber a compensação pecuniária pelos danos morais causados em sua obra intelectual. 

Do caso envolvendo o álbum “Mãos Dadas”, do sambista Noca da Portela, e o entendimento do STJ

A ação em referência, distribuída sob o nº 0486277-63.2011.8.19.0001, foi proposta pelo fotógrafo responsável pela imagem que estampou o disco de vinil intitulado “Mãos Dadas”, do sambista Noca da Portela, contra a gravadora Sony Music, sob a alegação de que a empresa teria alterado a fotografia original quando passou a comercializar CD’s daquele álbum.

Em primeira instância, o juiz da 9ª Vara Cível da Comarca da Capital do Rio de Janeiro acolheu a tese de prescrição dos direitos do fotógrafo, considerando que quando a ação foi proposta a violação já teria ocorrido em prazo muito superior aos 03 (três) anos fixados no Código Civil. 

Contudo, em segunda instância a sentença foi parcialmente reformada pela Segunda Câmara Civel do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, mantendo-se a prescrição sobre os danos patrimoniais, mas fixando-se que os danos morais do autor seriam imprescritíveis e impondo à gravadora o dever de pagar ao fotógrafo o valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com a incidência de juros moratórios desde a citação e correção monetária desde a publicação da decisão.

A discussão chegou ao Superior Tribunal de Justiça, por meio do Recurso Especial nº 1862910/RJ, que decidiu pela reforma do acórdão, adotando o entendimento de que, apesar de ser imprescritível a pretensão de garantir o exercício do direito moral, o direito de receber a reparação pecuniária está sujeita aos efeitos prescricionais dados pelo decurso do prazo de 03 (três) anos fixado no art. 206, §3º, inciso V, do Código Civil. 

O entendimento da Corte Superior seguiu o raciocínio de que:

“[…] no ordenamento jurídico pátrio, diversamente do quanto afirmado pelo Tribunal de origem, nem todos os direitos morais de autor são perpétuos. Somente os direitos morais relativos à integridade e à autoria é que subsistem mesmo depois do ingresso da respectiva obra em domínio público.”.

A decisão foi publicada no dia 09.02.2021 e ainda comporta recursos para o próprio STJ e para o Supremo Tribunal Federal (STF).

Conclusão

A solução conferida pelo STJ está em consonância com a doutrina e a jurisprudência pátrias, pois a imprescritibilidade está prevista apenas em situações excepcionalíssimas no ordenamento brasileiro (majoritariamente na esfera penal), devendo se privilegiar o instituto da prescrição como um mecanismo para manter a paz social e evitar a perpetuidade de conflitos. 

Advogado autor do comentário: Carlos Eduardo Nelli Principe

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